CAÇARIA

 


Convidou o veado para almoçar. Era temporada de caça. O veado sentiu-se seguro e disse que sim, ainda mastigando. Musgo verde. Musgo fácil. A filha do industrial, enciumada porque o pai conversava mais com o veado do que com ela, mandou uma mensagem a Pedro, o caçador.

— Daqui a meia hora estou aí! — disse o homem mau, calçando as botas.

Era outono. Às vezes, a gente se sente muito inseguro nessa vida, com uma angústia, uma taquicardia, um medo de fazer alguma coisa consigo mesmo ou com os outros — o veado refletia enquanto o industrial lavava uma espiga de milho.

— Qual é a passagem da Bíblia que você acha mais gostosa? — perguntou-lhe o industrial.

O veado baixou a cabeça e, com os cascos, bateu na mesa. — Adivinha! — Ah, Isaías 41:10 — disse o homem.

E quando o veado começou a repetir: — Não temas, pois estou contigo… — PITCHIUN!!

Levou uma chumbada no pescoço. Os seus olhos começaram a se apagar. O industrial o segurava. 

Do lado de fora, no alto da colina, o caçador pulava de alegria. A menina também pulava.

— O que aconteceu, papai? — a cínica o pergunta.

— Mataram o veado! — o homem disse, chorando. — Vem me chupar então, papai. Isso te conforta, não é?

Enquanto tirava a calcinha da vencedora, o pai pensava, babando: — Dois felizes é melhor do que um!

Mal sabia que Deus, enfurecido, também os caçaria.

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